quinta-feira, 26 de março de 2009

Consequências do aborto para a mulher

Uma palavra especial para as mulheres que realizaram um aborto

Por Joanne Angelo, M.D.


O Santo Padre, Papa João Paulo II, endereçou-se amorosa e compassivamente às mulheres que já realizaram um aborto em sua carta encíclica Evangelium Vitae (EV), ou “O Evangelho da Vida”. Ao mesmo tempo em que condenava o aborto como “um crime indizível”, ele reconhecia que “a decisão de realizar um aborto é frequentemente trágica e dolorosa para a mãe...” (EV 58).

O Santo Padre compreende que muitos fatores influenciam a decisão que uma mulher toma quando está sob o peso de uma gravidez inoportuna:

“Assim como a mãe, há também outras pessoas que decidem pela morte da criança que está no útero. Primeiramente, o pai da criança pode ter culpa, não apenas quando pressiona diretamente a mulher para ter um aborto, mas também quando indiretamente encoraja tal decisão da parte dela ao deixá-la sozinha face aos problemas da gravidez... Nem se pode subestimar as pressões que às vezes vêm do círculo familiar mais amplo e dos amigos. Algumas vezes a mulher fica sujeita a uma pressão tão grande que ela se sente psicologicamente forçada a cometer um aborto: certamente nesse caso a responsabilidade moral recai particularmente com aqueles que a compeliram a ter um aborto”(EV 59).

O Santo Padre também coloca a responsabilidade pela tragédia do aborto nos “médicos e enfermeiras... quando colocam à serviço da morte habilidades que foram adquiridas para a promoção da vida”, nos “legisladores que têm promovido e aprovado leis a favor do aborto”, e “na medida em que tiverem participação na matéria, nos administradores de centros de saúde onde os abortos são realizados” (EV, 59).

“Uma responsabilidade geral e não menos séria [continua João Paulo II] recai sobre aqueles que têm encorajado a propagação de uma atitude de permissividade sexual e falta de estima pela maternidade, e aqueles que deveriam ter assegurado – mas não o fizeram – políticas sociais e familiares em suporte às famílias” (EV 59).

“Finalmente”, ele conclui, “não se pode subestimar a rede de cumplicidade que chega a incluir instituições internacionais, fundações e associações que sistematicamente fazem campanha pela legalização e propagação do aborto no mundo” (EV 59).

A decisão da mulher de ter um aborto é feita no contexto de múltiplas pressões pessoais e sociais, naquilo que o Papa denominou como a rapidamente crescente “cultura da morte”. Embora a responsabilidade pela decisão de abortar não seja inteiramente, e talvez nem mesmo primariamente da mulher, ela é quem irá suportar suas pesadas consequências quase inteiramente sozinha pelo resto de sua vida. O cuidado pastoral do Santo Padre para com as mulheres que tiveram um aborto é ternamente compassiva, misericordiosa, e esperançosa no Evangelho da Vida.

“Gostaria de dizer uma palavra especial para as mulheres que tiveram um aborto. A Igreja está consciente dos muitos fatores que podem ter influenciado sua decisão, e ela não duvida que, em muitos casos, foi uma decisão dolorosa, e até mesmo devastadora” (EV 99).

A decisão da mulher de ter um aborto é sempre uma decisão difícil, feita sob a pressão do tempo, e frequentemente encoberta pelo segredo e pela vergonha. Muitos abortos ocorrem no primeiro trimestre – apenas poucas semanas ou poucos dias após a confirmação médica da gravidez. As mulheres são pressionadas a completar o “procedimento” rapidamente, e lhes dizem erroneamente que o que vai ser removido é apenas “um amontoado de células”, “algum tecido”, ou um “pré-embrião”. Ainda assim, toda mulher sabe que, se nada contrário interviesse, em questão de nove meses ela estaria segurando uma criança nos braços.

Ela pode acreditar que o nascimento dessa criança ameaçaria seu relacionamento com o pai do bebê, ou sua habilidade de terminar sua educação ou alcançar seus planos de carreira. Ela talvez esteja sob intensa pressão por parte do pai do bebê, de seus próprios pais, e de amigos, a fim de se submeter a um aborto. Paradoxalmente, ela talvez se encontre sozinha, incapaz de compartilhar o segredo de sua gravidez com alguém – com medo de perder sua estima e seu amor, ou por medo de reprovação ou abandono.

Muitas vezes se apresentam para um aborto em claro estado de angústia, chorosamente manifestando algo que eles não observam, sentindo-se emocionalmente entorpecida e despersonalizada. Elas passam pelo procedimento como se aquilo estivesse acontecendo com outra pessoa, e imitam a retórica da indústria abortista quando entrevistadas logo após: elas estão “aliviadas”; seu “problema está resolvido”; elas podem agora “continuar a vida” como se não tivesse havido nada mais significante do que uma extração de dentes.

Nos dias e semanas seguintes ao aborto, o mecanismo de defesa da negação pode se desvanecer, ao mesmo tempo em que a dor e a labilidade emocional devido a mudanças hormonais a lembram da agressão a seu corpo. Ela se lembra pungentemente da realidade do que ocorreu – de seu filho que morreu uma morte precoce e violenta – quando vai se aproximando a data na qual o bebê deveria ter nascido, ou quando ela vê outras crianças da idade que seu filho deveria estar, ou no aniversário de seu aborto, ou no Dia das Mães, ou pelo debate sobre aborto na mídia, ou ao ouvir um sermão pró-vida na igreja. Podem ocorrer “flashbacks”, lembranças do procedimento do aborto a cada vez que ela retorna ao ginecologista, ou simplesmente ao ouvir o som de uma máquina de sucção no consultório do dentista ou do aspirador de pó em casa, ou então ao assistir um filme ou notícia violenta na TV. Materiais educacionais sobre o desenvolvimento pré-natal ou sobre abortos ocorridos podem repentinamente trazer a verdade científica do que aconteceu para o foco, levando a depressão e culpa dilacerantes.

“A ferida em seu coração talvez ainda não tenha sarado” (EV, 99).

Mulheres que abortaram são frequentemente atormentadas pelo intrusivo pensamento, “Eu matei meu bebê!”. Pesadelos de bebês sendo sugados em pedaços por um tubo, ou dela causando acidentes a crianças, a fazem ter medo de dormir. Flashbacks ou pensamentos importunos durante o dia interferem com o trabalho, o estudo e relações pessoais. Elas também podem recorrer a álcool ou drogas para conseguir dormir à noite, ou para apaziguar a dor das horas acordada, ou podem se lançar febrilmente em muitas atividades, em uma tentativa de esquecer seu sofrimento, dor e vergonha. Profundos pensamentos de solidão e vazio podem-na levar a comer compulsivamente, alternando esse comer compulsivo com purgantes ou episódios de anorexia, ou esforços intensos para “consertar” relacionamentos íntimos ou desenvolver novos de maneira inapropriada, ou uma necessidade insaciável de substituir a criança perdida, a qualquer custo.

Para algumas mulheres a ferida dolorosa deve-se a um senso de si mesmo destroçado. Talvez ela sempre tenha tido uma imagem de si mesma como uma pessoa boa – bem-sucedida e admirada em casa, na escola e no trabalho. Talvez ela nunca tenha experimentado um grande fracasso, nunca tenha feito um grande erro na vida. Ela pode ser o produto de um ambiente que aplaude, acima de tudo, a beleza, a magreza, sucessos atléticos e acadêmicos, sucesso financeiro e autonomia pessoal. Uma gravidez precoce pode afetá-la profundamente, porque ameaça destruir seu universo, e parece tornar impossível realizar suas expectativas de sucesso (e as expectativas que os outros têm para com ela). O aborto se apresenta como uma solução óbvia, rápida e fácil para seu “problema”. Entretanto, o horror do que está acontecendo pode se tornar aparente a ela até mesmo quando o aborto está sendo feito. Ela pode entrar em pânico pela percepção do que fez: “Como pude fazer algo assim?!”.

A pessoa que ela vê no espelho não é a pessoa que ela conhecia. Sem nunca ter experimentado um amor incondicional, sem nunca ter tido uma experiência de fracasso ou qualquer necessidade perceptível de perdão, ela pode ser incapaz de aceitar seu “eu” ferido como real, de se perdoar, ou de pedir perdão.

O conceito de um Deus amoroso e misericordioso apresentado pelo Santo Padre pode ser inteiramente estranho para uma mulher cujo senso de seu “eu” foi destruído pelo aborto, e pode ser inicialmente difícil de entender e acreditar. Ainda assim, se ela encontrar a personificação desse verdadeiro amor e estima cristã em padres, conselheiros, e amigos fiéis católicos, isso pode ser o início de sua cura e um novo estágio em seu desenvolvimento como pessoa e como cristã.

“Certamente o que aconteceu foi e permanece terrivelmente errado. Mas não ceda à falta de coragem, e não perca as esperanças” (EV, 99).

Paradoxalmente, a dura condenação do Santo Padre ao aborto se torna ajuda para as mulheres que sofreram essa tragédia em suas próprias vidas:

“Dentre todos os crimes que podem ser cometidos contra a vida, o aborto procurado possui características que o tornam particularmente sério e deplorável... O ser eliminado é um ser humano bem no início de sua vida. É impossível imaginar alguém mais inocente. Esse ser humano jamais poderia ser considerado um agressor, muito menos um agressor injusto! Ele ou ela é fraco, indefeso, tão indefeso que lhe falta até mesmo aquela mínima forma de defesa que consiste no poder pungente do choro e das lágrimas de um recém-nascido. A criança não nascida está totalmente dependente da proteção e do cuidado da mulher que a carrega no ventre. E, ainda assim, é a própria mãe que toma a decisão e pede para a criança ser eliminada, e aquela que se encarrega de levar isso a cabo” (EV, 58).

Muitas mulheres carregam esses sentimentos em seus corações por anos, mas não encontram ninguém que compreenda seu sofrimento e sua culpa profunda. A negação do fato científico de que um pequeno ser –seu próprio filho – foi destruído durante o procedimento do aborto, uma negação que lhe permitiu submeter-se ao aborto quando ele aconteceu, desfez-se com o tempo. Elas têm sido abandonadas no confronto com o horror indizível do que realmente aconteceu, e com sua própria responsabilidade por isso, todo dia e toda noite, talvez por anos. Os médicos prescrevem remédios para dormir e anti-depressivos, ou medicação contra a ansiedade, sem explorar as causas profundas dos sintomas. Doenças psicossomáticas, distúrbios de alimentação, abuso de substâncias, fracassos nas relações interpessoais, inabilidade para se concentrar na escola ou no trabalho, ou tentativas de suicídio levam as mulheres que tiveram aborto, sem alívio, por entre incontáveis profissionais de saúde e conselheiros.

Ao menos aqui está alguém que compreende a enormidade do problema! Na verdade, a Igreja Católica talvez seja a única instituição que nunca minimizou o grave pecado que é o aborto. E ainda assim, o Papa está dizendo, “Não percam a coragem, não percam a esperança”. É possível que a vida continue, depois desse “crime indizível”?

“Tentem primariamente compreender o que aconteceu e encarar isso honestamente. Se vocês ainda não o fizeram, procurem se render com humildade e confiança ao arrependimento. O Pai das misericórdias está pronto a lhes dar Seu perdão e Sua paz no sacramento da Reconciliação” (EV, 99).

Mulheres que fizeram aborto comumente acreditam terem cometido o “pecado imperdoável”. Algumas permaneceram longe da Igreja por toda a sua idade adulta, depois de um aborto na adolescência. Aqueles que já ouviram falar da pena da excomunhão presumem que incorreram nela, e que isso é irrevogável. Algumas desejam ir à Missa e receber os sacramentos, mas estão convencidas de que isso nunca mais lhes será possível, e não ousam sequer entrar em uma igreja católica de novo. Outras, igualmente certas de terem sido permanentemente excluídas da recepção válida da Santa Comunhão e de outros sacramentos, mantém a participação – falsa – neles e em outras atividades paroquiais, com medo do escândalo ou de afastar-se da família e dos amigos. Elas se encontram cada vez mais afundando no desespero por causa de repetidas recepções sacrílegas de sacramentos e da duplicidade, só conhecida por elas. Cada feriado religioso, cada casamento, batismo, confirmação, primeira comunhão, ou funeral na família traz de novo o problema à tona, e não parece haver solução possível.

Profundamente arrependidas pelo que fizeram, elas talvez percam a esperança de algum dia encontrar perdão e alcançar a salvação eterna.

Para todas essas mulheres, a “Boa Nova” – que a Igreja Católica perdoa o aborto, e que o Papa as está convidando a “vir para casa” e estarem reconciliadas com Deus e em plena comunhão com seus irmãos católicos – é verdadeiramente assombroso! A pena da excomunhão, se realmente houve, pode e deve ser levantada.

Algumas pessoas dizem que a culpa que as mulheres católicas sentem depois de um aborto é “culpa católica”, implicando que, se a Igreja não falasse tão fortemente contra o aborto, essas mulheres não sofreriam uma vida toda de culpa. Pelo contrário, as mulheres católicas, e somente as mulheres católicas, depois de ouvirem o pecado do aborto ser proclamado em toda sua maldade, estão abertas ao sacramento da Reconciliação, onde elas ouvem o sacerdote dizer, em nome de Cristo, “Eu te absolvo de todos os seus pecados. Vá em paz”. Não poucas mulheres têm recorrido à Igreja Católica a fim de poder participar no amor misericordioso da confissão sacramental.

“Vocês entenderão que nada está definitivamente perdido, e também serão capazes de pedir perdão a seu filho, que agora está vivendo com o Senhor” (EV, 99).

Como essas palavras são belas e consoladoras para uma mulher cujo filho foi destruído pelo aborto e que acredita que o bebê está perdido para sempre! Em seu novo estado de reconciliação com Deus e com a Igreja, ela agora também está “vivendo no Senhor” e, portanto, capaz de se comunicar com seu filho, em Deus, através da Comunhão dos Santos. O Santo Padre está a convidando a pedir que seu filho ou filha lhe perdoe, o que talvez ela já tenha feito milhares de vezes em seu coração. Agora, pela primeira vez, entretanto, ela tem a certeza da real comunicação com sua criança e da reunião futura no céu com ela.

Muitas mães de crianças abortadas desenvolveram imagens mentais de seus filhos e filhas, lhes deram nomes, e algumas até as viram crescendo através dos anos em sua imaginação. Agora elas possuem a garantia do Papa de que suas crianças de fato existem e de que elas estão com o Senhor. Seus bebês deixaram essa terra em total inocência, e agora não podem estar sofrendo de maneira alguma. Apesar de continuar a sofrer a dor da perda, muitas mães recorrem a suas crianças como intercessoras diante de Deus para as pequenas e grandes necessidades da vida, para si mesmas e para os outros.

“Com o conselho e a ajuda amiga e experiente a outras pessoas, e como resultado de sua própria experiência dolorosa, vocês poderão se tornar as defensoras mais eloqüentes do direito de todos à vida” (EV, 99).

O amor com o qual o Santo Padre se dirige a mulheres que tiveram um aborto, e o amor incondicional com o qual a Igreja e a comunidade pró-vida a cercam, podem ser sua primeira experiência da caridade cristã. Se a sua vida ferida é tão profundamente valorizada e cuidada, ela começa a perceber-se como possuidora de dignidade e valiosa como pessoa. Ela passa a compreender que cada pessoa humana tem a mesma dignidade e valor – cada uma e todas elas foram compradas com o sangue de Cristo.

Seu profundo sofrimento lhe ensinou que o aborto não é a solução para o problema de uma gravidez inoportuna, mas antes é a transformação de um problema temporário em uma potencial tragédia para a vida toda. Algumas mulheres que tiveram abortos – muito poucas – decidirão falar sobre suas experiências dolorosas para ajudar outras pessoas a não cometerem os mesmos erros. Muitas mães de crianças abortadas, entretanto, defenderão o direito de todos à vida calmamente e eficientemente, rezando e trabalhando discretamente, dando suporte a atividades pró-vida e aconselhando a quem lhe pede ajuda, dando soluções positivas para os muitos problemas ameaçadores da vida em nossa sociedade.

”Através de seu compromisso com a vida, seja aceitando o nascimento de outra criança ou acolhendo e cuidando daqueles em maior necessidade de alguma pessoa próxima, vocês se tornarão promotoras de uma nova maneira de ver a vida humana”

Com o tempo, as mulheres que fizeram aborto e cujas cicatrizes foram curadas poderão expandir seu cuidado amoroso para com a vida em direção a todos aqueles que necessitam de alguma pessoa próxima. Elas poderão aceitar o desafio do Santo Padre, de:

“Transformar a cultura, para que apóie a vida... que promova um ‘novo feminismo’... que primeiro aprenda e depois ensine os outros que as relações humanas são autênticas se estiverem abertas a aceitar a outra pessoa: uma pessoa que é reconhecida por causa da dignidade que vem de ser uma pessoa, e não de outros fatores, como utilidade, força, inteligência, beleza ou saúde. Essa [diz o Santo Padre] é a contribuição fundamental que a Igreja e a humanidade esperam das mulheres. E é o pré-requisito indispensável para uma autêntica mudança cultural. (EV, 99).

Ao final de “Evangelho da Vida”, o Papa João Paulo II confia a causa da vida a Maria, chamando-a “um sinal certo de esperança e consolo”, a “luminosa aurora de um novo mundo”, e a “Mãe dos viventes”. Ele lhe pede que “olhe para o vasto número de bebês impedidos de nascer”, e lhe implora que o Evangelho da Vida seja proclamado, aceito, celebrado e testemunhado “a fim de construir, juntamente com todas as pessoas de boa vontade, a civilização da verdade e do amor, para a honra e glória de Deus, o Criador e amante da vida” (EV, 105). Que cada um de nós faça dessa oração a nossa oração.
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Traduzido do site: Rachel’s Vineyard Ministries (ajuda para cura de trauma pós-aborto)

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